segunda-feira, 26 de maio de 2014

O Procon e a antítese de órgão de utilidade pública

Tenho observado com frequência as visitas do PROCON nos estabelecimentos comerciais, onde nesses muitos anos de varejo tenho tido uma impressão cada dia pior a respeito do propósito da existência dessa entidade. Não quero falar de caso isolado para não dar conotação de desabafo nesse artigo, mas vou fazer aqui minhas mais sinceras observações a respeito desse órgão em sua forma de atuação.

Em primeiro lugar, meu entendimento a respeito do PROCON era de que tratava-se de um organismo dotado de poderes para interceder pelo consumidor na ocorrência de abusos na relação comercial, onde o descumprimento de contratos, falta de assistência ou de atendimento às reclamações, e até prática comercial abusiva, deveriam ser o escopo de seus agentes e fiscais. Cuidar da validade e da qualidade dos produtos é tarefa da Vigilância Sanitária, e cuidar da veracidade do peso das embalagens de acordo com o que está dentro é tarefa do IPEM. Assim, o Procon deveria ater-se em regular possíveis insatisfações dos consumidores buscando uma conciliação/reparação, advertindo e até multando o estabelecimento infrator conforme a gravidade.

Eu esperava, por exemplo, que o Procon devesse fiscalizar a formação de cartéis nos postos de gasolina de cada cidade; deveria fiscalizar os preços abusivos de estacionamentos de shopping centers e aeroportos, onde você não tem outra opção para estacionar e é obrigado a pagar o quanto pedem; deveria fiscalizar inclusive o preço dos alimentos e bebidas vendidos nos restaurantes dos aeroportos, onde você fica esperando uma conexão e é obrigado a se alimentar com o que vendem no saguão, pagando até R$ 5,00 por um pão de queijo; deveria fiscalizar os preços dos produtos sazonais, como material escolar, que sofrem aumento desproporcional na véspera de volta às aulas... Enfim, deveria fiscalizar coisas que pudessem lesar não apenas o consumidor mais mal esclarecido, mas o consumidor em regra geral que fica na mão de determinados prestadores de serviços ou comerciantes de produtos essenciais.

Mas ao contrário, vejo um Procon muitas vezes procurando o quê fazer em fiscalizações sem objetividade, apreendendo produtos erroneamente chamados de avariados, autuando estabelecimentos mediante alegações desproporcionais de consumidor estressado e agindo até com certa satisfação cada vez que seus fiscais executam alguma apreensão de produtos que julgam estar fora do padrão estabelecido em lei. Uma verdadeira falta de respeito ao empresário trabalhador e sua equipe de funcionários humanos, imperfeitos como qualquer outro, provocando inclusive um forte constrangimento ao estabelecimento comercial quando andam e se divertem fazendo apreensões e atirando displicentemente os produtos em um carrinho de compras em pleno horário comercial. Ao basear-se no velho jargão “o cliente sempre tem razão” o Procon deixa de ser uma entidade reguladora de abusos comerciais para se tornar uma ferramenta de opressão e penalização do comerciário de forma arbitrária, onde a intolerância do consumidor muitas vezes é levada ao pé da letra onde caberia apenas reparação de pequenos prejuízos ou desconfortos no atendimento.

E quando falo em lei, entro em uma esfera mais delicada ainda, que trata da interpretação da lei. O fiscal do Procon opera pela letra morta, sem uma análise contundente sobre os tipos de situação em que a letra deve ser tratada com mais, menos ou nenhum rigor.

Exemplo disso é o que chamam de “propaganda enganosa”. Se um estabelecimento comercial, como um supermercado, libera os funcionários do caixa em escala programada para cumprirem seu horário de almoço, o Procon entende que cada caixa fechado configura propaganda enganosa, pois onde há uma placa numerada identificando cada caixa, entende-se que deve haver um caixa aberto. Logo, um supermercado que tem 15 caixas registradoras precisa permanecer das 7 às 23 horas com todos eles abertos e com um funcionário operante para o público, se não quiser configurar propaganda enganosa. Já pensou se esse ponto de vista servisse também para os correios, prefeituras, Detran e demais órgãos públicos?!

Outro disparate é o que chamam de “caixa preferencial”, onde você deve ter caixas preferenciais identificados em número suficiente para atender às pessoas com necessidades especiais. Ora, se você oferece atendimento prioritário a essas pessoas, colocando-as para serem atendidas em qualquer caixa prioritariamente, isso não é suficiente. Você precisa ter caixa preferencial identificado e exclusivo parado para atender apenas essas pessoas. Nem que forme fila, e nem que fique sem fazer nada enquanto outros caixas estão com fila...

Quer mais um conceito? Chama-se “avaria”. Esse é o mais absurdo de todos, pois os fiscais do Procon andam fiscalizando produto com embalagem amassada e produto comestível quebrado, como chocolate em barra e ovos de páscoa, por exemplo. Agora se o chocolate em barra partiu ao meio, mesmo sem ter sua embalagem violada, o Procon recolhe alegando avaria. Como assim: avaria?! O produto é comestível, mastigável, e sua quebra em dois pedaços não configura prejuízo nenhum ao consumidor. Ora, já imaginaram se pela mesma linha de raciocínio eles começarem a recolher rosquinhas, espaguete, torradas e biscoito? Quem sobreviverá àquilo que o Procon chama de “defender o consumidor”? Até porque, salvo se o consumidor for cego, não há porque recolher produtos avariados de um supermercado, pois na opção de levar um inteiro ou um quebrado, o consumidor é soberano para escolher. Diferentemente de um computador, sapato ou relógio avariado, cujo funcionamento e aspecto exterior têm igual relevância ao consumidor e só serão verificados de fato ao abrir a caixa em casa.

Esse outro exemplo eu vou dar, mas por favor, não vão pensar que é piada, pois é muito sério: trata-se do "produto embalado". A loja tem uma seção de hortifruti e o lojista envole o coco seco em filme plástico transparente para que o produto não fique soltando sujeira da casca na banca. Ou então, um maço de alho poró, que o lojista envolve com filme plástico para preservar sua integridade. E por que não citar a melancia, que o lojista gentilmente parte em dois pedaços para que o cliente veja o seu interior e compre meia porção se lhe agradar, envolvida higienicamente em filme plástico. Pois o fiscal do Procon olha e autua um por um alegando tratar-se de produto embalado, e que segundo a lei deve conter peso, origem e informações nutricionais no rótulo... Vejam bem os amigos em que ponto chegamos no grau de intolerância e análise superficial dos amigos do Procon!

Isso sem falar no comércio da reparação por "danos morais", onde o Procon indiretamente contribui para que o consumidor brigue na justiça contra o estabelecimento pedindo indenização por danos morais para qualquer tipo de situação onde ele foi lesado, em uma perfeita demonstração de abuso dos direitos através da "lei do mais fraco".

Às vezes fico aqui buscando compreender o que leva um organismo sério como esse envolver-se em tamanha perda de tempo com fiscalizações e apreensões que nada trazem de proveitoso para o consumidor, lesando o estabelecimento. Antes, deveriam buscar a solução de conflitos, reparação de prejuízos ou troca de produtos onde o empresário muitas vezes não cumpre o seu papel. Em pesquisa no site do Procon do Distrito Federal encontrei os seguintes dizeres:

Missão
- Promover o equilíbrio das relações de consumo por meio da aplicação das normas de defesa do consumidor em benefício da sociedade.

Visão
- Ser nacionalmente reconhecido como referência na solução dos conflitos decorrentes das relações de consumo.

Objetivos
- Suprir a vulnerabilidade do consumidor;
- Conscientizar consumidores e fornecedores quanto aos seus direitos e deveres nas relações de consumo;
- Dar celeridade à solução dos conflitos decorrentes das relações de consumo;
- Harmonizar as relações de consumo.

Vejo que alguns pontos são poucas vezes levados em conta nesses conceitos, onde ignora-se que o comércio, representado e operado por pessoas, brasileiros assalariados, pessoas com necessidades especiais e menores aprendizes também faz parte da sociedade citada na Missão; não se promove a harmonia nas relações de consumo, conforme um dos Objetivos, mas ao contrário, protege-se incondicionalmente o consumidor e fere-se a propriedade do empresário empregador, cujo estabelecimento é uma das fontes de desenvolvimento econômico e social da nação; e não supre a vulnerabilidade do consumidor, vítima de abusos como no preço da gasolina com a nítida formação de cartéis em quase todas as cidades pequenas e médias do Brasil.

Enfim meus caros leitores, o que temos visto no Brasil é um verdadeiro abuso de poder, mau uso pelos órgãos dos fins para que se destinam, e mais uma forma de agravo à dura realidade do empreendedor desse famigerado país, que ao invés de promover o desenvolvimento com justiça, incentivos e oportunidades aos investidores, promove sim é uma dura opressão, cobranças de multas e impostos crescentes em uma verdadeira inversão de valores sobre quem é que move a economia de um país.

Abrir empresa aqui no Brasil é coisa para quem não tem juízo. Enquadrar-se nas normas do Procon, Anvisa (Vigilância Sanitária) e Ministério do Trabalho simultaneamente, tendo ainda que honrar com toda a tributação, taxas de funcionamento, alvarás e licenças de um estabelecimento comercial é missão quase impossível. Essa é a triste realidade de quem se aventura a empreender nesse Brasil subdesenvolvido. Quem dera voltássemos ao passado, onde a economia de subsistência evitaria todo o conflito entre vendedor e comprador. Quer um bom carro, um bom vinho ou uma boa camisa? Produza você mesmo, sem depender de um industrial fraudador ou um comerciante displicente...

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